Por Penélope Martins, do blog Toda Hora Tem História Eu era pequena quando visitei aquela casa na Cidade de Piedade. Nunca mais voltei pr’aqueles lados. Nem sei direito onde fica. Talvez eu pudesse colocar na internet para ver o mapa. Resolvi não descobrir porque o que conto tem mais magia do que realidade. Então…
Eu era pequena quando visitei aquela casa, em Piedade. A palavra piedade me cutucava. Quem teria pedido, por quem teriam clamado?
Visitamos uma plantação de alcachofras. Aparência de planta carnívora. Corremos entre as fileiras de mordidas e saímos intactas.
No final do percurso, uma cerca convidava à transgressão. Pulamos. Exploramos. Deixamos de ser gente pra ser bicho. Mato alto. Adultos muito longe para dizer que não podia, que era perigoso. Quase não dava pra ver o que tinha adiante.
Foi quando vieram os chifres na nossa direção. Minha amiga era ágil, pensou subir numa árvore, mas deu umas pernadas e pulou a cerca de volta. Eu fui pro outro lado. Mato alto. Quase não dava pra ver adiante.
Os chifres e aquela bufada de diabo procurando por mim.
Sempre fui péssima em pular cercas. Sempre fui péssima em correr rápido. Sou um bicho fácil de apanhar.
Minha amiga gritou ‘por aqui, por aqui’, e eu fui. Salvei o couro antes que os chifres me furassem.
Voltamos pra casa disfarçando o ocorrido. Ninguém poderia saber que invadimos o terreno do vizinho. Quer dizer, alguém já sabia. Esse alguém bufafa, tinha chifres e era o diabo nos cascos atrás de nós.
Voltamos para a casa pra tomar o lanche da tarde. A casa ardia o sol do dia inteiro. Quase cinco horas. Chá em xícaras de porcelana decoradas com raminhos verdes de bambu.
– Bambu me lembra Saci. – eu disse pra minha amiga.
– Não seja boba, Saci não existe. – ela respondeu.
Foi nessa hora que a casinha de madeira, pendurada na parede da sala, estalou. A porta se abriu. Um pássaro com olhos vidrados apareceu gritando:
– CUCO, CUCO, CUCO!
Soltamos um berro. A tia veio da cozinha rindo.
– Calma, crianças, é só o Cuco.
Depois a tia contou uma história.
Cuco tinha sido aprisionado por uma velha bruxa que vivia naquelas matas. Cuco era um protetor dos outros animais. Quando a bruxa tentava aprisionar um deles, Cuco gritava:
– CUCO, CUCO, CUCO!
A bruxa foi pegando raiva do pássaro… Queria ele pra sempre calado.
– E como era a bruxa? – eu perguntei, interrompendo a história.
– Ah… Dizem que ela tinha cascos nos pés. Dizem que bufafa. Dizem até que tinha chifres como o diabo.
Minha amiga e eu, paralisadas.
E mais história, por aqui não conto. Deixo que saibam sobre a Casa do Cuco, de Alexandre Camanho, da editora Pulo do Gato. Pode ser que vocês descubram o caminho pra alcançar piedade…
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